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ADOLESCÊNCIA E CONFLITOS NA FAMÍLIA

Gerenciar a educação de crianças e adolescentes é uma tarefa que enfrenta desafios não imaginados há poucas décadas. Muitas famílias estão sem rumo diante de pequenos seres precoces e insubordináveis que demonstram cada vez menos respeito em casa e na escola, quando ainda a frequentam. Chega o tempo em que nosso olhar precisa atingir o contexto que gera essa rebeldia.
Sabemos que antigamente o desrespeito aos mais velhos não era aceito e todos conhecemos, muitas vezes por experiência própria, a maior eficiência dos limites e da autoridade que possuíam os pais sobre os filhos. Em poucas décadas, em muitos casos, muito da tirania se voltou contra os pais e hoje é comum a história de filhos agressores. Com o problema das drogas isso se agrava e torna mais frágil a relativa autoridade dos pais.
Em muitas famílias disfuncionais hoje o “filho problema” se tornou o centro das atenções, sendo na prática o detentor do controle, chegando mesmo a chantagear os pais ou incutir-lhes uma série de medos quando não conseguem o que exigem. Os pais aqui já perderam sua função de educadores. Quando isso aconteceu?
Lembramos que uma das manifestações mais claras de um vínculo positivo entre duas ou mais pessoas é a comunicação. Não falamos de uma comunicação apenas verbal e rotineira, mas da comunicação significativa. Quando os pais a perderam, perdendo assim o contato com aquilo que é significativo para a criança e posteriormente para o adolescente?
A regra geral é que em algum momento a comunicação e o contato começou a mostrar indícios de problemas e os responsáveis por algum motivo perdem a conexão com os sentimentos do adolescente. Os motivos para tal desconexão podem ser inúmeros e variáveis, porém na prática se expressa em excesso de autoridade, em permissividade ou negligência.
No tipo de tratamento autoritário, existe a expectativa de que os filhos se moldem à própria vontade, independente de suas tendências e necessidades. Aqui eles não são ouvidos porque os pais desejam principalmente satisfazer seus critérios ou têm medo de perder o controle sobre eles.
No caso dos pais permissivos, por outro lado, os filhos já estão no controle, e o poder é mantido quando os pais não ousam frustrar os desejos e impulsos das crianças ou adolescentes estabelecendo assim o padrão onde cedem para evitar contrariedades.
Quando um dos genitores é ausente ou negligente, por sua vez, o mesmo tem poucas condições de estabelecer um laço de afeto significativo, o que pode ser prejudicial para um desenvolvimento saudável, principalmente quando a ausência é sentida também pelo cônjuge.
A maioria dos pais também varia bastante o tratamento, assumindo todas as posturas, autoritária, permissiva ou negligente/ausente com o mesmo filho, porém existe a tendência de que uma delas esteja sendo a mais frequente. Não podemos subestimar as dificuldades dos pais em estabelecer uma comunicação genuína e significativa, uma vez que muitos também não receberam este modelo de seus próprios pais.
Nem sempre é fácil ter um relacionamento bom, saudável e sobretudo gostar da companhia dos filhos e vice-versa, principalmente quando os problemas já estão instalados. Os pais distantes/negligentes precisam estar sinceramente interessados em reestabelecer este vínculo. Os autoritários precisam perder o medo de ceder o controle e por vezes colocarem-se no mesmo nível hierárquico na família, pois também têm muito a aprender. Os permissivos, por sua vez, podem certificar-se de que as frustrações e limites que seus filhos não conseguem tolerar agora, serão muito mais difíceis de superar quando eles forem adultos. Essa falta de limites pode se tornar uma grande contribuição para o futuro fracasso dos adolescentes nos níveis pessoal e profissional.
Quando o adolescente não encontra em casa as referências das quais necessita, uma comunicação positiva, apoio e parâmetros que afirmem sua auto-estima, é natural que vá buscar entre seus pares aqueles que podem reconhecê-lo e afirmar sua identidade. Quanto o ambiente doméstico é negativo, o adolescente tentará satisfazer suas necessidades de estima e pertencimento fora de casa. Não há nada de errado em construir amizades e relações saudáveis com amigos, mas ao viverem num ambiente de conflitos onde não sentem que são apreciados, desejarão se afastar podendo até mesmo se colocar em risco para conseguir o que precisam.
A segurança e auto-estima de que os adolescentes necessitam, porém, não pode ser proporcionada por pais que não a desenvolveram. Em muitos casos, a insatisfação de um dos pais ou de ambos com a própria vida se manifesta em casa mesmo que jamais seja verbalizada. Um pai ou uma mãe insatisfeita com a própria vida irá compensar isso inconscientemente nos demais. Lembrando um profundo pensamento de C.G. Jung: "Não há nada que tenha influência psíquica mais forte no ambiente circundante, especialmente sobre os filhos, do que a vida não vivida dos pais. Quando os pais descuidam de sua felicidade para procurar a felicidade dos filhos, deixam aos filhos uma herança má, uma má impressão do passado."
O significado da própria vida não pode ser depositado totalmente sobre os filhos, pois isso os tornaria responsáveis pela felicidade dos pais, que devem ser relativamente independentes para que o sistema familiar funcione bem. Quando os pais vivem suas vidas através dos filhos estão construindo a infelicidade de todos e a necessidade de independência sentida pelos adolescentes causará um grande desequilíbrio, mais cedo ou mais tarde.
Já conhecemos um grande número de pessoas que esperam um desempenho do qual elas mesmas não estão à altura. Não é difícil discursar honrosamente para quem não conhecemos, porém, em casa, isso não irá funcionar nem mesmo com as crianças pequenas. Falar significa pouco comparado às ações e o discurso de uma pessoa só terá efeito se toda sua vida o acompanhar, de modo que na maioria das vezes as ações terão muito mais impacto sobre o comportamento de um filho. E afinal, perceberemos que nosso filho não será influenciado por nosso discurso e nem tanto por nossas ações isoladas e sim por quem somos. Aquilo que motiva os pais em relação a seus filhos é uma marca indelével para a relação, principalmente quando se trata de algo inconsciente.
Algumas vezes os filhos possuem limitações físicas, psicológicas ou possuem problemas congênitos e isso os torna mais vulneráveis e dependentes de uma atenção maior. Torna-se ainda mais difícil separar o que é uma proteção necessária despendida em favor de um filho daquilo que é excessivo e prejudicial. É importante que os pais não façam pelos filhos aquilo que os mesmos já possuem condições de fazer, sob o risco de que se tornem despreparados ou mesmo incapazes de conduzir a própria vida. Há uma linha tênue que divide o que é necessário daquilo que é apenas mais conveniente entre os pais e filhos. Na maioria das vezes é mais difícil para os pais oferecerem um tratamento justo do que se amoldarem às expectativas e hábitos já condicionados nas relações familiares.
Para que ocorra mudança de padrão num sistema familiar, é preciso que todos estejam dispostos a questionar qual é sua participação no que não está saindo como deveria. Uma vez que todos estejam dispostos a serem honestos e reavaliarem sua própria vida, uma nova perspectiva se abre para a família.
- Juliana Corrêa
Psicóloga CRP 08/09846
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